Cookies, esses monstros da internet
Foi em 1994 que o engenheiro da computação Lou Montulli, da Netscape, inventou o cookie. A partir dessa invenção as páginas web ganharam a capacidade de se lembrar de nossas senhas, preferências, configurações de idioma e várias outras informações relevantes.
Quem não gostaria de fazer compras com um assistente ao seu lado, escutando nossas preferências e segurando nossas sacolas enquanto andamos pela loja e escolhemos o que queremos, não é mesmo? Os cookies de Lou viabilizaram essa possibilidade, ou seja, a invenção em si foi revolucionária ao estabelecer a gravação de blocos de dados localmente — isto é, no dispositivo em uso pelo usuário enquanto ele acessar o site — para recuperação posterior, ou seja, em uma visita futura do mesmo usuário a este site. Tudo isso, então, configurava uma troca privada de informações entre usuário e site.
Mas menos de dois anos depois, as empresas que comercializam anúncios descobriram como hackear os cookies para uma função muito menos nobre e invasiva: rastrear o comportamento dos usuários. Estes novos cookies do mal começaram a ser chamados de cookies de terceiros, ou third-party cookies, em contraposição aos first-party cookies originais, que trocavam dados apenas entre usuário e site. Os cookies do mal são como aquelas escutas que são plantadas em filmes de espionagem: captam tudo o que está sendo feito pela vítima, mas só compartilham estas informações com seus aliados. Os espiões podem colocar seus cookies nos sites de outras pessoas, para armazenar o que você visitou e que tipo de dados você informou.
É graças ao trabalho desses cookies espiões que, se eu buscar pelo termo escova de dentes no Google, começo a ver um monte de anúncios de escovas de dentes sendo vendidas por sites que variam desde supermercados e farmácias até a Amazon ou o Mercado Livre. Por mais que alguém possa argumentar que cookies são um mal necessário e que seria impossível navegar na internet atualmente sem esbarrarmos com eles e cedermos nossos dados de navegação, eu acredito que esta coleta de dados é uma invasão de privacidade que torna os antes inocentes cookies verdadeiros monstros da internet.
Ao longo do tempo e durante anos, os cookies foram coletando dados de forma cada vez mais descontrolada, graças à falta de regulamentação quanto a rastreamento e vigilância de usuários online, um cenário que só mudou a partir de 2018, com a introdução de legislações de proteção à privacidade como a GDPR (General Data Protection Regulations) europeia e a LGPD brasileira, responsáveis, aliás, pela grande quantidade de popups que atualmente aparecem pedindo para você aceitar cookies sempre que visita um site na internet. Não é nem de longe a solução perfeita, mas pelo menos agora é possível termos noção do que cada site quer rastrear e porque, e concordar (ou não) com esse rastreio de informações.
Mas não é apenas clicando e consentindo (ou não) com a utilização de cookies que podemos combater o uso inapropriado de nossas informações pelos anunciantes. Também podemos escolher usar navegadores que desabilitaram totalmente o uso de cookies de terceiros: os primeiros que fizeram isso foram o Safari, da Apple, em 2017, e o Firefox, da Mozilla, in 2019. Já o Chrome, produto do Google que, caso não esteja claro, é antes de qualquer coisa uma empresa de comercialização de anúncios online, acaba de implantar um recurso chamado de Privacy Sandbox, que diz substituir os cookies terceiros mas que, ainda assim, coleta muitos dados pessoais dos usuários, alimentados por um processo de opt-in em que você concorda com a coleta de dados mas apenas porque não o entende direito, ou não consegue evitar.
Se você não está pagando pelo produto, você é o produto.
Em relação a empresas como Google, Facebook e tantas outras, normalmente disfarçadas de redes sociais, nunca é demais repetir aquela velha máxima que diz que quando não estamos pagando por um produto, é porque nós somos o produto: quer um navegador de internet gratuito? Ótimo. Apenas tome cuidado com o que está adquirindo (ou com o que está concordando) ao usá-lo gratuitamente.